16 outubro 2017

Crónica de um viajante a Washington (4)

Washington
Enfiado quase sempre num hotel, pouco conheci da cidade, com excepção de viagens de Uber (chique a valer) entre pontos de origem e destino. Não me parece uma cidade que tenha muito para ver do ponto de vista arquitectónico. Terá, seguramente, do ponto de vista dos museus. É grande, ampla, organizada e com boas estradas - estamos, afinal, na capital dos EUA. 

É uma cidade cara, onde um café custa 2,5 USD, um pequeno-almoço básico 10 USD. Mas, como em muitos aspectos dos EUA, tem curiosidades. Ontem, por exemplo, fui convidado para jantar com um colega sul-africano e três chineses (um casal de pais e um sobrevivente). Fomos a um restaurante onde o preço médio dos pratos era de 28 a 30 USD, uma caneca de cerveja quase 7. O restaurante tinha bom aspecto, a comida era boa. Mas tinha individuais de papel...



Cosmos Club (I)
O jantar de gala do CCI (organização internacional a que pertenço) realizou-se no Cosmos Club que, segundo me dizem, é um clube de homens, selecto, restrito a pessoas que se tenham notabilizado de alguma forma: cientistas, militares de alta patente, prémios Nobel (sim, sim...), políticos, etc. Uma espécie de Turf português em que a aristocracia é do intelecto, não do sangue... O dress code era claro: casaco e gravata para os homens, vestido ou calças elegantes (há uma expressão de que não me lembro) para senhoras. Havia uma elegância generalizada, com um colorido dado pelos trajes regionais da Índia, do Bangla Desh ou da Indonésia. Um colega do Gana apresentou-se de smoking. 

Cosmos Club (II)
Este parágrafo é ingénuo, eu sei, mas de uma ingenuidade que não deixa de me comover. O jantar no Cosmos Clube foi seguido de um momento musical: um conjunto (banda, como se diz agora) Motown a tocar e a cantar músicas "antigas", mas que ainda agitam corpos. Num repente, na pista improvisada, o israelita dançava com a etíope, o egípcio com a chilena, os ganeses ou os indonésios num grupo indistinto, a rapariga elegante e quase seráfica do Bangla Desh era puxada para a pista com um sorriso discreto  Eu, cavalheiro português, dancei um slow (sim, sim, é assim que se diz) com a anfitriã, que me parecia desejosa de agitar o corpo sem ter com quem. Dancei My Girl, uma música que me pareceu particularmente adequada para dançar com uma rapariga que tem oito filhos e foi, dizem-me posteriormente, campeã (ou praticante apenas) de culturismo.

 

Dançar continua a ser, para mim, um movimento afectivo. Sou menos entusiasta de grupos, mas é gratificante pensar que pessoas que politicamente se poderiam odiar, dançam umas com as outras como se não houvesse amanhã, pessoas que riem e se agitam antes de voltar à dureza das vidas de volta das crianças com cancro. Dançar tem, de facto, uma dimensão primitiva e profundamente libertadora.

Discurso americano [ou também Cosmos Clube (III)]
A anfitriã é americana, obviamente. Tudo no discurso dela é americano. A América é um grande país, ajuda muitos países africanos (e disse isto a uma etíope, porque os EUA ajudam muito a Etiópia...); este clube é muito restrito, os lustres vieram de França e custaram não sei quantos milhares de dólares, ainda esta semana despedi quatro pessoas porque aqui felizmente é fácil despedir...

Almoço rapidamente no MacDonald's. Deixo passar uma família de afro-americanos, volumosos e cheios de crianças. Dizem-me simpaticamente: thank you. Respondo simpaticamente you're welcome. Há um momento de espanto com a minha correcção e murmuram entre si. Uma rapariga nova, que parecia ter um ananás na cabeça não resiste a desejar-me: have yourself a nice day...

JdB

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